sexta-feira, 24 de setembro de 2010

ONGs apresentam propostas em biossegurança e biodiversidade


Quarta-feira, 22 de setembro de 2010
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Sociedade civil apresenta propostas para Brasil defender na COP MOP no Japão
Sessenta e cinco organizações enviaram um documento ao governo brasileiro com várias recomendações para as negociações na 5ª Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena (MOP-5) e 10ª Conferência das Partes da Convenção de Diversidade Biológica (COP-10), que acontecem no próximo mês no Japão. As recomendações foram debatidas durante a Plenária Nacional realizada nos dias 15 e 16 de setembro, em Brasília, e encaminhadas ao Ministério das Relações Exteriores - Itamaraty, Ministério responsável por estabelecer consenso nacional entre os demais ministérios e setores da sociedade civil para as negociações de Nagoya.

A COP MOP deste ano irá reunir representantes de cerca de 170 países para analisar o resultado das metas de preservação da fauna e da flora assumidas em 2002 e definir quais serão os próximos objetivos até 2020. Segundo o documento encaminhado pela sociedade civil ao Itaramaty, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou que os países fracassaram com relação às metas de redução da taxa de perda da biodiversidade. Os dados são alarmantes. Cerca de 150 espécies são extintas por dia em todo o mundo, afirma o Secretário da Convenção da Diversidade Biológica. Esta drástica redução da biodiversidade também se encontra na quantidade de culturas cultivadas para o cons umo humano. Atualmente apenas sete variedades correspondem a 75% da alimentação mundial e a FAO denuncia que (1) bilhão de pessoas passam fome atualmente no mundo.

O governo brasileiro apesar de alguns números a seu favor, como a redução do desmatamento na Amazônia, não vem implementando ações efetivas contra a perda da biodiverisidade brasileira, ilustrada pela vergonhosa iniciativa de flexibilização das proteções do Código Florestal e anistia aos desmatadores. O descontrole da contaminação genética dos campos de milho convencional pelo milho transgênico, por exemplo, pode gerar danos irreversíveis ao patrimônio genético e cultural do país ao colocar em risco as variedades de milho crioulo melhoradas há séculos pelos pequenos agricultores familiares e camponeses. “Identificamos e denunciamos que o cercamento territorial e tecnológico dos agricultores, comunidades tradicionais e povos indígenas através da concentração de terras, principalmente por empresas transnacionais, e dos recursos biológicos transformados em mercadoria pela biotecnologia e por normas de propriedade intelectual, representam séria violação aos Direitos Humanos”, afirma o documento.

Uma das recomendações ao governo requer que o Brasil, um dos mais megadiversos do planeta, paute-se pelo princípio da precaução e pela conservação e uso sustentável da biodiversidade e não por interesses de mercado. “É inaceitável que a posição do Brasil se paute por interesses de mercado, subordinando a Convenção da Diversidade Biológica às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC)”, afirma o preâmbulo do documento. A sociedade civil também denuncia que são as atividades econômicas de empresas transnacionais e nacionais e seus lobbies nos espaços de negociação de acordos internacionais e nacionais uma das causas mais fortes pelo fracasso coletivo com relação ao cumprimento das metas de preservação da biodiversidade.

As recomendações da sociedade civil abrangem diversos assuntos, como a necessidade do Brasil identificar as cargas que contém transgênicos; moratória e zoneamento ecológico antes de autorização de pesquisas com árvores transgênicas; manutenção da moratória às tecnologias de restrição de uso (as sementes conhecidas como Terminator) e às atividades com geoengenharia, como a fertilização de oceanos; aplicação do princípio da precaução à produção de agrocombustíveis; e ainda com relação às mudanças climáticas, recomendam que a conservação de florestas não sirva de licenças para as emissões do hemisfério norte.

Ainda receberam destaque as recomendações específicas com relação ao Regime internacional de Acesso e Repartição de Benefícios para que se garanta um regime efetivo de repartição dos benefícios oriundos do acesso aos recursos e conhecimentos tradicionais, em respeito aos direitos dos povos indígenas e comunidades locais. Também reafirmaram a necessidade de se estabelecer um regime de proteção sui generis ao conhecimento tradicional de acordo com os princípios da CDB e com os sistemas locais de regulação, os quais se distanciam em muito dos direitos de propriedade intelectual estabelecidos atualmente.

Com relação ao Protocolo suplementar ao Protocolo de Cartagena sobre a responsabilidade por danos decorrentes do comércio de transgênicos, as organizações e movimentos da sociedade civil manifestaram-se por um regime internacional forte e vinculante que estabeleça sistemas de acesso e exigibilidade para responsabilizar os operadores da tecnologia, como também que “normas nacionais rígidas sejam estabelecidas para que os custos com as medidas necessárias tomadas no caso de danos não recaiam sobre as sociedades nacionais, mas sobre os setores que lucram com a tecnologia, especialmente o operador-detentor da tecnologia”.

Esta é a primeira vez que a sociedade civil se organiza para estabelecer consensos e recomendar que o governo brasileiro defenda, em âmbito internacional, posições coerentes com as legislações nacionais e com o respeito aos direitos humanos, e os direitos dos povos indígenas e comunidades locais. As organizações e movimentos sociais mostram-se como atores nacionais e internacionais importantes para aperfeiçoar os mecanismos de participação democrática e exigibilidade de compromissos internacionais assumidos pelos Países, em especial na defesa dos direitos humanos e da conservação e uso sustentável da biodiversidade do planeta.

Mais informações:
Terra de Direitos – Larissa Packer: 41 3232-4660
Terra de Direitos - Ana Carolina Brolo de Almeida: 41 3232-4660


segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Brasil não chega bem à COP da biodiversidade

Agência Estado, 20 de setembro de 2010 | 14h 37

Brasil vai à reunião de biodiversidade sem atingir metas
CIRCE BONATELLI - Agência Estado

A apenas um mês do encontro global para discussões sobre a preservação da natureza, o Brasil ainda não apresentou um relatório oficial com o resultado de metas e compromissos assumidos nos últimos anos. A décima edição da Conferência das Partes sobre Biodiversidade (COP-10), vai reunir em Nagoya, no Japão, de 18 a 29 de outubro representantes de cerca de 170 países para analisar o resultado das metas de preservação da fauna e da flora assumidas em 2002 e definir quais serão os próximos objetivos até 2020. Dados preliminares mostram que o Brasil teve avanços isolados na conservação do meio ambiente, mas não atingiu os objetivos mais importantes.

Uma das metas brasileiras mais relevantes era a de alcançar pelo menos 30% da Amazônia e 10% dos demais biomas e da zona costeira e marinha inseridos em unidades de conservação (zonas protegidas por lei, com restrição ao uso e exploração). Balanço preliminar do Ministério do Meio Ambiente antecipado à Agência Estado mostra que a Amazônia chegou perto, com 26,2% do território protegido. Cerrado (7,9%) Mata Atlântica (7,8%), Caatinga (7,3%), Pantanal (4%), Pampa (3,5%) e zonas costeira e marinha (1,5%) também ficaram abaixo do estipulado, mesmo com o crescimento do total de reservas nos últimos anos.

O aumento no número de unidades de conservação faz parte de uma lista com 51 metas de conservação, estipuladas por resolução da Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio) de 2006, quando o Ministério do Meio Ambiente era comandado pela agora candidata do PV à Presidência, Marina Silva.

Outra meta relevante determinava redução de 75% no desmatamento da Amazônia, um quesito que foi alcançado. A derrubada da floresta caiu de 27 mil quilômetros quadrados em 2003/2004, para pouco mais de 7 mil quilômetros quadrados em 2008/2009, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O mesmo sucesso não foi alcançado na Mata Atlântica, que tinha meta de desmatamento zero, nem nos demais biomas, que deveriam ter redução de 50%. O Pantanal, por exemplo, perdeu 4.279 quilômetros quadrados entre 2002 e 2008 (2,82% de sua área).

Em relação à fauna, o diretor de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias, admitiu que o País não conseguiu reduzir em 25% a lista de espécies animais ameaçadas de extinção. Ainda sem um número oficial, o ministério já estima crescimento nessa lista. E em relação às queimadas, disse que o total de incidentes teve a queda esperada de 25% entre 2002 e 2009, embora o dado não contabilize as ocorrências deste ano.

O diretor afirma que a justificativa para o não cumprimento das metas está numa série de fatores, entre elas a falta de recursos financeiros e de equipes. "O Brasil é muito grande, tem muitas demandas", disse. Dias alegou que as ações não dependem apenas do Ministério do Meio Ambiente, mas também de outros órgãos do governo e da mobilização de empresas e cidadãos comuns. "Enquanto não se mudar os paradigmas para produção e consumo sustentáveis, não teremos todos os avanços necessários", afirmou.

Segundo Dias, outro problema está na falta de incentivos fiscais à preservação e à sustentabilidade, assim como já existe na área da cultura com a Lei Rouanet. Questionado se esses pontos não foram considerados na hora de lançar as metas, ele respondeu: "Nessas resoluções, a gente joga a meta até acima daquilo do que se pode fazer, para que sirva como um estímulo. É assim que se trabalha".

A secretária de Biodiversidade do ministério, Maria Cecília de Britou, lembrou que nenhum dos países cumpriu as suas metas, e destacou os avanços por aqui. "Sozinho, o Brasil foi responsável pelo cumprimento de 75% das unidades de conservação definidas como meta para o mundo inteiro", defendeu, durante entrevista em agosto.

Esse avanço chegou a ser elogiado no relatório Panorama da Biodiversidade Global 3, publicado neste ano pela Organização das Nações Unidas (ONU). O relatório destaca o empenho "desproporcional" do Brasil para o crescimento da rede mundial de áreas protegidas e corrobora que o País responde por quase 525 mil quilômetros quadrados do total de 700 mil quilômetros quadrados de unidades de conservação existentes no mundo.

Brasil na COP-10
O Brasil pretende ter um papel de protagonista em Nagoya, liderando o grupo de países ricos em biodiversidade, conforme antecipou em agosto a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. O plano é apresentar os custos para a preservação ambiental e pleitear recursos para o seu cumprimento, por meio de mecanismos em que países do Hemisfério Norte financiem projetos em prol da biodiversidade nos países do Hemisfério Sul.

Apesar do discurso considerado positivo, especialistas fazem a ressalva de que o não cumprimento integral das metas no Brasil associado a outras pendências internas possa arranhar o poder de negociação do governo brasileiro. Um ponto fraco é a nova proposta do Código Florestal que, segundo ambientalistas, dá muitas brechas para o desmatamento, e anistia quem já desmatou.

"O Brasil tem, sim, moral para conduzir negociações em Nagoya, mesmo que não seja uma moral perfeita. Ela é um pouco tímida", avalia Cláudio Moretti, diretor de biodiversidade da WWF Brasil. "Já se o Código Florestal for votado do jeito que está hoje, essa moral acaba", disse.

O diretor de Conservação de Biodiversidade do ministério minimiza essa questão e defende que o Brasil estará bem representado pelos avanços obtidos, mesmo aquém da meta. "Nenhum país cumpriu as metas, e os maiores avanços são daqui. Vamos chegar com moral e com vontade", defendeu Dias. A comitiva brasileira em Nagoya terá a ministra do Ambiente, outros representantes da pasta e do Itamaraty. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não confirmou, mas não deve ir.

Passado e futuro
A meta geral da COP-10 é definir novas ações para barrar a devastação da fauna e da flora até 2020. Soma-se a isso um conjunto de temas mais específicos, como incentivo ao desenvolvimento sustentável, criação de reservas naturais e a repartição justa de benefícios originários de recursos genéticos (como produtos cosméticos e farmacêuticos).

O principal empecilho para a evolução desses temas foi a dificuldade de emplacar as metas na agenda política e econômica, segundo ambientalistas. Por isso, na última COP, realizada em Bonn (Alemanha), foi depositada uma grande expectativa na elaboração do estudo "A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade" (Teeb, na sigla em inglês), que se propõe a mostrar as oportunidades de negócios sustentáveis e os danos financeiros com a perda da biodiversidade.

A pesquisa foi concluída neste ano e revelou que os prejuízos à economia mundial podem ficar entre US$ 2 trilhões e US$ 4,5 trilhões devido à perda de fauna e flora. "Esperamos que a partir daqui, seja levado adiante um projeto internacional com direção de governos e bancos para reconhecer o capital natural e explorar esses recursos de forma sustentável", afirmou o economista indiano Pavan Sukhdev, coordenador do estudo.

domingo, 19 de setembro de 2010

Ceará insiste em subsidiar o veneno

Rede Brasil Atual

Agrotóxicos livres de impostos causam problemas de saúde no CE, diz pesquisadora
Decreto assinado em 1997 pelo então governador Tasso Jereissati (PSDB), hoje candidato ao Senado, pode ter causado aumento da ocorrência de casos de câncer no estado
Por: Cida de Oliveira, Rede Brasil Atual

Publicado em 15/09/2010, 16:17

Guararema (SP) - A isenção de impostos para agrotóxicos no Ceará, em vigor desde 1997, é responsável por um uso indiscriminado de insumos na lavoura e na pecuária. Segundo Raquel Maria Rigotto, médica, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Ceará, a prática provoca danos à saúde de trabalhadores e ao meio ambiente. A crítica foi feita durante sua palestra na manhã desta quarta-feira (15), no Seminário Nacional contra o uso dos Agrotóxicos, promovido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Guararema (SP).

Um decreto do então governador Tasso Jereissati (PSDB), hoje senador e candidato à reeleição, isentou do pagamento de diferentes tributos e contribuições (ICMS, IPI, PIS/Pasep e Cofins) estaduais os insumos agrícolas. A norma foi mantida pelas gestões de Lúcio Alcântara (PR) e Cid Gomes (PSB). São incluídos inseticidas, fungicidas, formicidas, herbicidas, parasiticidas, germicidas, acaricidas, nematicidas, raticidas, desfolhantes, dessecantes, espalhantes adesivos, estimuladores e inibidores de crescimento (reguladores), vacinas, soros e, ainda, medicamentos produzidos para uso na agricultura e na pecuária.

Desde 2007, Raquel coordena pesquisas sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde do trabalhador e dos consumidores de frutas no Ceará. Os resultados que ela tem encontrado não são nada animadores. Somente no ano passado, 42 pessoas morreram de câncer em Limoeiro do Norte (a 200 quilômetros da capital) – a maioria delas agricultores. No município, são cada vez mais comuns a pulverização aérea sobre as lavouras de abacaxi, melão e banana, localizadas muito próximas das casas dos trabalhadores.

O número é considerado alto para uma cidade com pouco mais de 50 mil habitantes. Embora os médicos não associem a causa da doença aos agrotóxicos, Raquel não tem dúvidas. "A relação entre câncer e agrotóxicos está muito estabelecida pelas pesquisas científicas. A ação cancerígena desses produtos é potencializada com as misturas que geralmente são feitas", vaticina. 

Os agrotóxicos são utilizados na Chapada do Apodi – na divisa entre Ceará e o Rio Grande do Norte – de forma indiscriminada e desconhecida, segundo a pesquisadora. Pelo menos 68% das pessoas que aplicam o produto para combater as pragas não sabem com que tipo de veneno estão lidando.

Segundo Raquel, estudos da companhia de gestão dos recursos hídricos no Ceará encontraram contaminação por oito de dez substâncias agrotóxicas no Aquífero Jandaíra, a segunda maior reserva subterrânea da Região Nordeste, situada entre os estados do Ceará e do Rio Grande do Norte.

O seminário realizado na Escola Nacional Florestan Fernandes, do MST, discute o uso indiscriminado de agrotóxicos no país. O Brasil é um dos maiores consumidores de insumos químicos na produção agrícola. Segundo especialistas, boa parte dessas aplicações são feitas sem critério e em excesso.